Não te preocupes com isso, tens tempo quando cresceres, dizia o pai.
Para quê essa corrida, tens tantos anos à tua frente, reforçava a mãe.
E ela acreditou, convenceu-se que assim era. Tinha muito tempo para viver!
Passaram dias, semanas, meses, anos. De repente, sem pré-aviso, sem ao menos um sinal, viu o tempo futuro escondido. Perdeu-se a memória do tempo passado. Deixou de ser dona do tempo presente.
Desalmada, tresloucada, sôfrega, tentou agarrá-lo, puxá-lo a si, abraçá-lo, numa ânsia intemporal de quem sente o tempo escassear. Sem tempo a perder, valeu-se de todas as armas que o pouco tempo lhe dava. Aproveitou cada milésimo de tempo do tempo que viveu. Arriscou cada minuto, fosse qual fosse o tempo a chegar. Lutou desenfreada contra a falta de tempo. Apanhou todas as migalhas do tempo roubado.
E percebeu. Finalmente, percebeu a importância do tempo que se não tem, quando uma porta se abre permitindo ao tempo fugir. Agora… afaga o tempo que tem como se não tivesse tempo, sem esperar que o tempo venha, não vá o tempo desistir de chegar a tempo e então… perder o tempo, como aqueles que o não têm.